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A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve a reintegração de um carteiro da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), dispensado por justa causa devido a faltas injustificadas. A decisão destacou que o trabalhador sofria de alcoolismo, reconhecido como doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e, portanto, não poderia ser tratado como desvio de conduta. O caso reforça a jurisprudência do TST, que considera a dependência do álcool uma condição de saúde, protegida por lei, e não um motivo válido para demissão por justa causa.
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ToggleO Contexto do Caso
O carteiro, que atuava em Igaratinga (MG), enfrentava um histórico de problemas relacionados ao alcoolismo, tendo sido internado várias vezes em instituições psiquiátricas por meio do plano de saúde da empresa. Embora o trabalhador estivesse buscando tratamento, ele não conseguiu superar a dependência, o que resultou em diversas faltas injustificadas ao longo dos anos. Mesmo ciente da sua condição, a ECT optou pela demissão por justa causa em outubro de 2017, após 13 anos de serviço.
Na reclamação trabalhista, o carteiro argumentou que a empresa estava ciente de sua fragilidade mental e que, ao invés de demiti-lo, deveria ter encaminhado o caso ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para avaliação de possível aposentadoria por invalidez ou concessão de benefício previdenciário.
A Defesa da ECT
A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos defendeu sua posição, alegando que tomou todas as medidas cabíveis para ajudar o empregado a se recuperar. Entre 2008 e 2016, o trabalhador foi incluído em um programa interno voltado para dependentes de álcool e drogas. No entanto, de acordo com a empresa, o carteiro acumulou mais de 205 faltas injustificadas e foi alvo de diversas suspensões disciplinares, sem que essas sanções resultassem em melhora no comportamento.
Ainda segundo a ECT, o carteiro teve oportunidade de justificar suas faltas durante o processo administrativo, mas não o fez, o que teria reforçado a decisão de demiti-lo por justa causa.
Decisão Judicial: Anulação da Justa Causa e Reintegração
O caso foi inicialmente julgado pela 36ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que determinou a anulação da demissão por justa causa, ordenando a reintegração do carteiro e a condenação da ECT ao pagamento de R$ 5 mil por danos morais. O tribunal concluiu que o alcoolismo, diagnosticado por um perito, era o principal fator responsável pelas faltas injustificadas e que, portanto, a demissão havia sido injusta. A decisão foi confirmada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG).
Alcoolismo: Doença Reconhecida pela OMS
Ao recorrer ao Tribunal Superior do Trabalho, a ECT argumentou que, mesmo que a justa causa fosse revertida, a manutenção do vínculo de emprego seria arriscada. Contudo, a relatora do caso, ministra Maria Helena Mallmann, ressaltou que o alcoolismo crônico é considerado uma doença pela Organização Mundial da Saúde, que compromete a capacidade de discernimento do indivíduo. Dessa forma, trabalhadores que sofrem de transtornos mentais e comportamentais relacionados ao uso de álcool ou outras substâncias psicoativas não podem ser penalizados com a dispensa por justa causa.
A ministra ainda destacou que o alcoolismo, como condição médica, exige tratamento e não pode ser confundido com indisciplina ou desvio de conduta. "Não se trata de falta de caráter ou desinteresse pelo trabalho, mas sim de uma condição médica que afeta profundamente o comportamento e as capacidades cognitivas do indivíduo", afirmou Mallmann.
Jurisprudência do TST
A decisão do TST, que foi unânime, reforça uma linha de entendimento já consolidada no tribunal, segundo a qual trabalhadores que sofrem de doenças mentais ou comportamentais, como a dependência do álcool, não podem ser dispensados por justa causa com base em seu estado de saúde. Ao contrário, a empresa tem o dever de oferecer o suporte necessário, como tratamentos médicos e, quando indicado, o encaminhamento para o INSS para avaliação de incapacidade laboral.
Esse julgamento é um marco na proteção dos direitos de trabalhadores com doenças como o alcoolismo e reflete a importância de as empresas compreenderem a natureza dessas condições, bem como o papel que devem desempenhar no apoio e tratamento adequado dos empregados. No caso do carteiro, ficou claro que, apesar dos esforços da ECT, a decisão de demissão não levou em consideração a gravidade da doença e suas implicações legais.
Considerações Finais
A reintegração do carteiro com alcoolismo, mantida pelo TST, sublinha a necessidade de compreensão e tratamento adequado para condições de saúde que afetam o desempenho profissional. As empresas, ao enfrentarem casos semelhantes, devem priorizar o apoio e o tratamento dos seus empregados, em vez de optar por sanções severas que desconsideram o estado de saúde mental ou físico. Esse tipo de decisão judicial serve como um alerta para que o ambiente corporativo seja cada vez mais inclusivo e atencioso com aqueles que enfrentam desafios relacionados à saúde mental e comportamental.
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