Doação de Imóvel a Filhos de Sócio Não Caracteriza Fraude, Afirma Tribunal Superior do Trabalho

Tempo de leitura: 4 minutos

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu, por unanimidade, que a doação de um imóvel realizada por um sócio de empresa aos filhos não configura fraude à execução, especialmente quando a transação ocorreu antes do ajuizamento da reclamação trabalhista. O julgamento destaca um importante aspecto da legislação trabalhista e do direito de propriedade, reafirmando que, para caracterizar fraude, é necessário mais do que uma simples doação entre membros da mesma família.

O Caso: Doação Realizada Antes da Ação Trabalhista

Em 2013, um dos sócios da Sekron Alarmes Monitorados Ltda., localizada em Campos do Jordão (SP), fez uma doação de um imóvel aos seus dois filhos. A mudança na matrícula do imóvel foi registrada em março de 2015, ou seja, antes do ajuizamento da ação trabalhista que posteriormente resultaria em condenação à empresa. O processo trabalhista foi iniciado em dezembro de 2015 por um ex-empregado da empresa, e a condenação, que totalizou cerca de R$ 140 mil, ocorreu em dezembro de 2016.

Em 2019, durante a fase de execução da dívida trabalhista, o imóvel foi penhorado. No entanto, os filhos do sócio, que haviam recebido a doação do imóvel antes da ação trabalhista, questionaram a penhora alegando que não houve fraude na transação.

O Tribunal Regional do Trabalho: Fraude à Execução?

Inicialmente, tanto o Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Guarulhos quanto o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) consideraram a doação como fraude à execução. Ambos os tribunais basearam sua decisão na alegação de que os filhos do sócio sabiam da difícil situação financeira da empresa e do fato de que o patrimônio da companhia estava comprometido com dívidas trabalhistas.

O TRT-SP argumentou ainda que, como a empresa enfrentava ações trabalhistas desde 2011 e não possuía outros bens disponíveis para quitar suas dívidas, a doação do imóvel poderia ser vista como uma tentativa de transferir o bem para membros da família, evitando que ele fosse penhorado na fase de execução.

A Decisão do TST: Ausência de Má-Fé e Registro de Penhora

No entanto, o Tribunal Superior do Trabalho divergiu da decisão dos tribunais inferiores, considerando que a doação não configurava fraude à execução. O relator do caso, desembargador convocado José Pedro de Camargo, explicou que, de acordo com a Súmula 375 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a caracterização de fraude à execução requer, primeiramente, que haja o registro de penhora sobre o bem ou provas claras de má-fé por parte do beneficiário da doação. No caso específico, como a doação ocorreu antes da ação trabalhista e não havia registro de penhora sobre o imóvel no momento da transação, não se poderia presumir que houve intenção fraudulenta por parte dos filhos.

O relator destacou que, embora os filhos morassem no mesmo endereço e soubessem da situação financeira do pai, não havia elementos suficientes para provar que a doação foi feita com o intuito de prejudicar os credores da empresa. De acordo com o entendimento do TST, não se poderia estender a presunção de má-fé a uma transação legal que ocorreu antes do início da reclamação trabalhista.

Implicações da Decisão

Essa decisão tem importantes implicações tanto para o direito de propriedade quanto para a interpretação de fraudes à execução em processos trabalhistas. Ela reforça que a simples doação de bens entre familiares, realizada antes do surgimento de uma ação trabalhista, não é suficiente para caracterizar fraude, desde que não haja elementos concretos de má-fé ou tentativa de ocultar bens para evitar o pagamento de dívidas.

Além disso, a decisão do TST esclarece que a presunção de fraude exige provas substanciais, como o registro de penhora ou evidências claras de má-fé, e não pode ser baseada apenas na proximidade entre o doador e o beneficiário da doação.

Conclusão

O entendimento do TST é um importante marco na jurisprudência sobre fraudes à execução, especialmente em casos envolvendo empresas em dificuldades financeiras e transações entre membros da mesma família. Para os trabalhadores e empresários, a decisão serve como um alerta sobre as condições que podem ou não caracterizar fraude à execução, além de reforçar que, para que uma doação seja considerada ilegal ou fraudulenta, é necessário ir além de simples suposições e buscar provas claras de má-fé.

Se você está enfrentando um processo trabalhista ou tem dúvidas sobre transações imobiliárias em meio a questões de dívidas, é sempre recomendável procurar orientação jurídica especializada para evitar complicações legais no futuro.

Leia: TRT-RS Reconhece Responsabilidade Subsidiária do iFood por Dívidas Trabalhistas de Motoboy